Com a aproximação dos Jogos Olímpicos, o governo decide remover os homeless das ruas de Tóquio.
Tóquio - Antes da realização da cerimônia de abertura das Olimpíadas no dia 23 de julho, os oficiais do governo metropolitano de Tóquio trataram de realizar "uma limpeza" na área onde se localiza um grande número de moradores de rua na capital.
Moradores de rua acampados numa rua de Shinjuku adornada com bandeiras olímpicas, Tóquio. Foto: Takaki Fujino.
Centenas de pessoas em situação de rua no centro de Tóquio receberam avisos de despejo. Essas pessoas não têm endereços fixos e nem um lugar para onde ir.
Um homem de 62 anos (identidade mantida em sigilo) que viveu perto do prédio do governo metropolitano de Tóquio por um mês, no distrito de Shinjuku, disse que um funcionário do governo o abordou na rua e entregou um bilhete de "despejo" no dia 8 de julho.
"Remova os seus pertences até o dia 21 de julho porque as suas coisas estão obstruindo a rua. Região gerenciada pelo governo metropolitano de Tóquio", dizia o bilhete.
Quando o sem-teto questionou o oficial sobre a razão da data limite de permanência no local, ele teve a seguinte resposta: "Porque há um evento relacionado às Olimpíadas".
O evento que o oficial se referiu é, na verdade, a chegada da tocha olímpica no prédio do governo metropolitano, no dia 23 de julho. Esse evento está programado algumas horas antes do início da cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos.
A informação sobre a desocupação do lugar desanimou o morador de rua e, também, esvaziou profundamente seu espírito olímpico.
O senhor sem-teto se mudou para Tóquio na infância, quando tinha 10 anos de idade. Na juventude, ele praticou bastante futebol quando era estudante do ginásio e colegial.
Depois de terminar o ensino médio, tornou-se motorista de caminhão e viajou por todo o Japão.
Em 2016, quando o senhor assistia à cerimônia de encerramento das Olimpíadas do Rio de Janeiro pela televisão de seu apartamento, ele se deparou com a cena do ex-primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, representando o famoso personagem Super Mario. Estava dado a partida para as Olimpíadas no Japão.
A aparição do ex-primeiro-ministro japonês no evento brasileiro fez o coração do senhor disparar: "Tóquio é a próxima!", exclamou ele.
Cerca de dois anos atrás, o pobre senhor pediu demissão de seu último emprego por problemas ligados ao trabalho. Ele logo acabou gastando toda as suas economias e foi parar nas ruas como um homeless.
Encontrar um novo emprego tem sido difícil para o senhor sem-teto. Ele tem dependido de ajudas de grupos de apoio para poder se alimentar.
O que antes era felicidade, agora é tristeza e uma crise existencial diante das Olimpíadas de Tóquio. "Para onde devo ir?", indagou o senhor.
Homeless sob bandeiras olímpicas.
Lonas azuis e caixas de papelão, próximas do prédio do governo metropolitano de Tóquio, são lembretes onipresentes de que muitas pessoas foram deixadas de fora da riqueza da movimentada capital.
Homens, mulheres, jovens e idosos deitam-se ou sentam-se de pernas cruzadas nas calçadas das ruas movimentadas da metrópole.
Sob as cabeças dos moradores de rua, bandeiras promovendo as Olimpíadas de Tóquio balançam com o vento. Às vezes, algum veículo adornado com o logotipo "Tóquio 2020" passa diante dos olhos de um sem-teto.
Um outro morador de rua, com aproximadamente 30 anos e identidade mantida em sigilo, se inscreveu na ajuda da assistência pública da prefeitura e encontrou um lugar para ficar no início de julho.
Um oficial da prefeitura providenciou para que o jovem sem-teto ficasse em um hotel. Mas uma condição foi imposta: ele deveria deixar o hotel no dia 22 de julho.
O hotel, onde o jovem sem-teto ficaria até o dia 22, estava garantindo quartos para hóspedes das Olimpíadas. Mas, com o banimento dos espectadores nos estádios e ginásios olímpicos durante os jogos na capital, o rapaz acabou recebendo uma espécie de "indulto" para permanecer mais tempo no hotel.
Embora o jovem sem-teto ainda tenha um lugar para ficar, a provação deixou-o um tanto amargo com a situação.
"Sem emprego, estou em uma situação vulnerável. Não pude nem reclamar quando disseram que isso era para as Olimpíadas", disse o rapaz.
De acordo com o Tsukuroi Tokyo Fund, um grupo de apoio aos cidadãos na capital, as autoridades japonesas têm adotado abordagens mais duras contra os moradores de rua desde 2013, quando Tóquio foi nomeada a cidade-sede dos Jogos Olímpicos de 2020.
Os parques de Tóquio foram fechados e iluminados durante à noite para desencorajar os sem-teto de dormir no local.
Em janeiro de 2019, havia em torno de 1.126 moradores de rua vivendo em parques, em margens de rios e em prédios de estações de trem de Tóquio, de acordo com uma pesquisa do governo metropolitano.
Já em janeiro deste ano, o segundo levantamento contabilizou 862 pessoas em situação de rua. O paradeiro das outras 264 pessoas sem-teto que já não constam mais na lista é desconhecido.
Fonte: The Asahi Shimbun.
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